A população negra é 54% da população absoluta do
Brasil,segundo o IBGE.
Desde a sua chegada ao Brasil no século 16 ,essa
população,quando não estava nas senzalas, estava segregada em espaços afastados,quer nos
bairros periféricos das cidades,quer nos
territórios quilombolas.
Na cidade de São Paulo não foi diferente.Bairros como
Liberdade e Bixiga,na região central,ou Barra Funda,na zona oeste, tiveram,num
segundo momento de ocupação,a forte presença da população negra.
No caso da zona leste essa ocupação aconteceu em bairros
como Penha,Vila Matilde e Vila Esperança,por exemplo.Atualmente esses bairros
não são considerados periféricos do ponto de vista geográfico.Devido ao
crescimento da cidade e ao processo de gentrificação ,boa parte da população
negra que vivia nesses espaços foi forçada a se deslocar para espaços mais longes.Os
que ainda permanecem mantem diversas organizações que tem por objetivo
preservar as tradições religiosas e culturais dos afrodescendentes.
Como espaços da presença negra na zona leste podem-se destacar
:
1 – Igreja Nossa
Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Penha de França
É a única edificação erguida por negros que se mantém
intacta em seu local original. A construção teve início em 24 de julho de 1904,
quando a pedra fundamental foi lançada.O templo só veio a ser inaugurado dois
anos depois com o traslado das imagens sendo feito nos dias 21 e 22 de abril de
1906.
A importância desta igreja deriva do fato de ter sido
inteiramente construída pela Irmandade dos Homens Pretos, grupo fundado por
negros no século XVIII. Seu significado transcende a simplicidade do pequeno edifício,
feito em taipa de pilão e contando apenas com uma nave, capela-mor, galeria
lateral e sacristia. Além de ser um patrimônio material da cidade de São Paulo com
a sua arquitetura colonial paulista e tombado pelo CONDEPHAAT em 1982, é um
local de cultura afro-brasileira que resiste até os dias atuais graças às ações
culturais como a Festa dos Homens Pretos. A festa ocorre anualmente sempre no
mês de junho e faz parte do calendário oficial da cidade de São Paulo.Tem
início no primeiro domingo do mês com o levantamento do mastro e atinge o ponto
alto quando ocorre a coroação dos reis da festa e a apresentação de grupos de
congadas e maracatus vindos de várias regiões. Além disso,sempre no primeiro
domingo de cada mês,às 10 horas, ocorre uma missa inculturada.
Avenida Penha de França 4.
2 – Estátua de Itamar
Assumpção
Em 2021 foi inaugurada,na entrada do Centro Cultural da Penha,uma estátua em homenagem ao compositor e cantor negro que morou por muitos anos no bairro. O trabalho foi feito em bronze pelo escultor Leandro Junior.
O artista foi conhecido por utilizar diversos gêneros
musicais em suas criações, como o samba, o rock, funk e até reggae. As
composições eram carregadas de críticas sociais e Assumpção se tornou uma referência da música
independente.
Largo do Rosário 20.
3 – Praça Dona
Micaela Vieira
Tia Micaela Vieira,como era conhecida,foi a única parteira do bairro da Penha entre o final do século XIX e começo do século XX.Muitos penhenses daquela época nasceram pelas suas mãos. Residia junto ao Grupo Escolar Santos Dumont, na Praça 8 de Setembro, em casa feita de taipas, onde hoje se ergue o edifício Santa Amália. Não olhando, muitas vezes, distâncias a percorrer, fazia o seu trabalho exaustivamente, quase sempre sem interesses lucrativos,a pé ou a cavalo.
Em homenagem a essa moradora tão ilustre,a praça localizada
no cruzamento das Ruas Padre João e Doutor João Ribeiro,recebeu o seu nome.É
uma praça pequena,mas muito gostosa.É arborizada,com bancos,aparelhos de
ginástica,banca de jornais e revistas,pontos de ônibus e táxis.
Outra homenagem que a Tia Micaela Vieira recebeu foi a
criação de um cordão carnavalesco em 2018. O Cordão da Dona Micaela desfila pelas ruas do bairro da Penha de
França todos os anos no carnaval.
4 – Largo do Peixe
Delimitado pelas Ruas Joaquim Marra e José Mascarenha,na Vila Matilde,está o Largo do Peixe.
Era nesse local que Alberto Alves da Silva,o “Seu
Nenê”,acompanhado de outras pessoas,fazia rodas de samba e tiririca(capoeira
paulistana). Como consequência desses encontros nasceu o Grêmio Recreativo Cultural Escola de Samba Nenê de Vila Matilde,no
final de 1948.
Uma das escolas de samba mais tradicionais de São Paulo,a
Nenê da Vila Matilde foi onze vezes campeã do carnaval paulistano.Atualmente
faz parte do Primeiro Grupo de Acesso.As cores são o azul e o branco e seu
símbolo é a águia.
Seu Nenê foi durante toda a vida da escola o seu presidente.
Só passou o comando em 1996 para seu filho, Alberto Alves da Silva Filho, em
razão da idade, mas continuou a desfilar na sua escola até falecer em 2010.
5 – Igreja Nossa
Senhora da Esperança
Construída na década de 1930,a Igreja Nossa Senhora da Esperança é administrada pelos Monges Beneditinos Olivetanos e está localizada na Vila Esperança.
Era na frente desta igreja que,durante muitos anos,se
concentravam as associações carnavalescas que depois partiam pelas ruas da Vila
Esperança fazendo o que era considerado um dos melhores carnavais de rua de São
Paulo e atraia multidões. Sambistas ilustres como Elza Soares e Adoniran
Barbosa chegaram a participar destas festas.
Refrão da canção “Vila Esperança”,de Adoniran Barbosa :
VILA ESPERANÇA ·
FOI LÁ QUE EU PASSEI
O MEU PRIMEIRO
CARNAVAL
VILA ESPERANÇA
FOI LÁ QUE EU CONHECI
MARIA ROSA, MEU
PRIMEIRO AMOR
O carnaval da Vila Esperança ainda existe,mas a concentração
agora é próxima a Estação de Metrô Vila Matilde.
“Até que os leões contêm
as suas próprias histórias,os caçadores serão sempre os heróis das narrativas
das caças.” Provérbio africano.
São Paulo é a cidade com a maior população negra do Brasil
em números absolutos.As histórias dessa população estão por toda parte mas,na
maioria das vezes,não são contadas. Escrever sobre a presença do povo negro na zona
leste da cidade de São Paulo,tanto no passado,como no presente,renderia muitas
e longas teses.O que eu escrevi aqui é apenas uma gota no oceano.
Veja também :
Um pouco da São Paulo negra do passado e do presente.
Fonte : pesquisa no Google e ida a campo com o Sesc Bom
Retiro.
Fotos : Izabel Heitor.
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